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Carnaval, a festa da periferia


Carnaval 2016: Desfile da Mangueira (Foto: Daniel Collyer/Hipermídia Comunicação)

#PraCegoVer [FOTOGRAFIA]: Há uma plateia ao fundo da imagem segurando bandeiras diversas e de pé assistindo ao desfile. Ao fundo, à esquerda há uma pessoa fantasiada com adornos vermelhos e com balões de corações que flutuam. No centro e à esquerda, há um mestre-sala com uma fantasia branca e dourada com braços abertos e segurando a bandeira da escola de samba com a mão esquerda. No centro, à direita, está a porta-bandeira com uma fantasiada com um vestido branco com detalhes dourados e a borda do vestido com plumas amarelas. Ela também está com braços abertos e com a mão direita segura a bandeira da escola de samba. Tanto o mestre-sala quanto a porta-bandeira estão cantando.


Que o carnaval é a maior festa do planeta, isso todo mundo já sabe. O que pouco se conhece, infelizmente, são os bastidores desse grande espetáculo. Apesar de ser um tema recorrente em diversas manifestações artísticas, no cinema, o carnaval dificilmente é abordado a partir da perspectiva de quem o produz, ou seja, da periferia. No Brasil, um dos grandes responsáveis por retratar o carnaval a partir desse olhar foi o cineasta Carlos Diegues. Conservando uma das principais características do Cinema Novo, de uma forma ou de outra, as obras de Diegues que têm o carnaval como objeto principal ou simples pano de fundo também acabam por escancarar questões sociais pouco discutidas.


Em seu filme Orfeu (Carlos Diegues, 1999), o diretor usa como cenário para a trama a preparação que toda a comunidade do fictício “Morro da Carioca” faz para o grande desfile de carnaval. Mesmo passando por inúmeras dificuldades, tal como a repressão policial. É possível ver que, mais do que festa “para gringo ver”, o carnaval tornou-se um grande elemento da cultura da periferia. Como o maior palco para a folia no país, o Rio de Janeiro tem suas maiores escolas de samba com nomes homenageando bairros da zona norte e da baixada fluminense, como a “Estação Primeira de Mangueira”, vencedora do grande desfile de 2019.


Além de Orfeu, que é um grande clássico do diretor, Diegues ainda tem muitas outras obras que buscam abordar o carnaval como contexto para inúmeros temas. Uma recente produção de que se pode falar, é o documentário Favela Gay (2013). Nele, através de entrevistas a diversas figuras da comunidade LGBT que vivem em favelas do Rio de Janeiro, é traçado um panorama sobre a situação desse grupo duplamente invisibilizado. A partir desse objeto principal, acaba sendo apresentado pelos entrevistados a participação da comunidade LGBT de periferia no carnaval. Mais do que uma simples aparição durante a festa, no documentário se fala sobre uma necessidade da população LGBT para a existência do carnaval. A liberdade em relação à sexualidade e sua performance, somada ao espírito alegre, característico da população residente das favelas atuais, são como a alma do clima de carnaval e, sem esses elementos, a festa não seria a mesma.


Carlos Diegues, famoso por fazer filmes que abordam questões sociais latentes no Brasil, consegue, através dessas duas obras, falar sobre o que o favelado tem de melhor sem deixar de comentar as dificuldades que essa camada da população enfrenta. Os quilombos que existiam no Brasil durante a época da escravidão, além de um lugar de resistência e união da população negra, eram também o único lugar possível de expressão da cultura dos povos africanos. As favelas e periferias de hoje em dia traçam um caminho parecido: o lugar abandonado pelo Estado resiste produzindo sua arte e cultura. O carnaval é um dos maiores exemplos dessa construção. A grande diferença é que hoje em dia, o que era apagado e suprimido, é aplaudido. No entanto, essa obra prima produzida pela periferia ainda não é devidamente reconhecida como produto de sua autoria.


Referências:


Cacá Diegues toma posse como imortal da Academia Brasileira de Letras. G1, 2019. Disponível em: <https://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2019/04/13/caca-diegues-toma-posse-como-imortal-d a-academia-brasileira-de-letras.ghtml >. Acesso em: 02 de fevereiro de 2020 às 17:47.


CARNAVAL, Mais. Enredos 2016 || Inocentes de Belford Roxo - Cacá Diegues - Retratos de Um Brasil em Cena. Youtube, 2015. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=C8oTnTLYCUk>. Acesso em: 02 de fevereiro de 2020 às 18:32


KREUTZ, Katia. Cinema Novo. Academia Internacional de Cinema (AIC), 2018. Disponível em: <https://www.aicinema.com.br/cinema-novo/ >. Acesso em: 05 de fevereiro de 2020 às 1:55.


MÓR, Samira. Marcas de brasilidade na obra cinematográfica Orfeu, de Cacá Diegues. UFJF, 2011. Disponível em: <http://www.ufjf.br/darandina/files/2011/08/Marcas-de-brasilidade-na-obra-cinematogr%C3 %A1fica-Orfeu-de-Cac%C3%A1-Diegues.pdf->. Acesso em: 02 de fevereiro de 2020 às 18:08.


Victoria Freitas, Graduanda em Letras, Português/Espanhol (FFLCH-USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2019/2020.


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