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“A Conspiração Antivacina” e o vírus da desinformação


#ParaTodosVerem [Fotografia]: Cena do Filme “A Conspiração Antivacina”. Em frente de um local ao ar livre com vegetação relativamente alta, um homem branco com óculos e camisa xadrez está sorrindo e segurando um cartaz preto e branco que diz “Vaccines save lives”.


Desde antes do avanço das tecnologias da comunicação, falar sobre vacinação é um assunto complexo por diversos motivos. Apesar do filme “Conspiração Antivacina” (2021) da diretora Colette Camden, conter apenas o recorte de algumas comunidades do Estados Unidos na atualidade, é possível encontrar vários paralelos e motivações para essa variedade e complexidade de motivos. Durante o enredo é possível notar que a problemática da vacinação torna-se polêmica quando relacionada a questões capitalistas e religiosas, desdobrando-se para uma rede de outros problemas relacionados ao medo, preconceito e a infeliz ascensão da propagação da desinformação.

A narrativa conta com detalhes sobre o início e progressão do mais recente movimento antivacina e, possivelmente, o mais mortal, já que esse cresceu muito no contexto da pandemia da covid-19. Ao que se pode constatar esse atual interesse contra a vacinação foi iniciado por Andrew Wakefield em 1995 que na época, era professor e consultor em gastroenterologia em uma escola de medicina em Londres e “publicou um artigo na principal revista médica The Lancet, dizendo que a vacina contra o sarampo poderia causar a doença de Crohn (inflamação dos intestinos).” (ERMAN, 2022) e poucos anos depois, o artigo “teve colaboração de outros 11 pesquisadores, ligando a Tríplice Viral ao aumento do autismo.” (ERMAN, 2022).

Quando outros cientistas foram revisar a publicação de Andrew, encontraram uma produção totalmente enviesada que nada correspondia aos métodos científicos necessários para a confirmação dessas afirmações, porém a essa altura a desinformação já estava publicada e se aproveitava do medo da população para cada vez mais adentrar no cotidiano das famílias com bebês e crianças pequenas em casa. Mesmo após a descoberta das segundas intenções de Wakefield em tirar a credibilidade da empresa que fabricava as vacinas que ele criticava e mesmo após a cassação de seu registro médico, o movimento antivacina não parou de crescer, permitindo o retorno de doenças anteriormente erradicadas. A exemplo da volta do sarampo ao Brasil, que em 2019 teve “cerca de 18 mil casos em 526 municípios em 23 Unidades da Federação, com 15 óbitos.” (DIAS, 2020).

Seguindo o enredo, o filme mostra uma importante ferramenta de manipulação da informação, pois percebe-se que a convicção e descrença de adultos em relação à própria vacinação e a de suas crianças é totalmente baseada na boa locução de uma pessoa que se mostra interessada em ouvir as histórias de vida de cada paciente/cliente e aproveitando-se disto, manipula-se uma rede de desinformados para obtenção de lucros exorbitantes. A covardia, ganância e sensação de impunidade permite cenas como as vistas no filme, onde de um lado, um ótimo locutor, vendendo e conquistando seu público com um “remédio milagroso” para crianças feito de alvejante, e do outro familiares passam a questionar fatos já provados pela ciência e acreditam fielmente que as partes do intestino que as crianças expelem ao tomar o alvejante são as “doenças” sendo eliminadas.

Outro fator marcante sobre a complexidade do assunto está relacionado com a desconfiança geral para com as autoridades, no filme, vê-se mais especificamente essa relação sob a visão da população preta que após séculos de racismo estrutural tem fortes motivações para não acreditar no que o governo pretende com a vacinação em massa. Nesse sentido paralelos podem ser feitos com algumas religiões, populações marginalizadas e certos interesses políticos, pois como na prática, de fato, agulhas e líquidos sendo injetados nos corpos de várias pessoas soa como algo assustador e sem o devido diálogo com todas as populações, notícias falsas como a implantação de chips por meio das vacinas são narrativas fáceis de serem criadas. Além disso, também existem as dicas de remédios naturais milagrosos que qualquer pessoa pode criar ou recomendar, mas nesse sentido também existem controvérsias, pois conhecimentos milenares de indígenas e religiões de matriz africana não podem ser descartados, já que falta interesse em grande escala para estudos na área e seus descarte acarreta ainda mais afastamento entre as populações e a comunidade científica.

Conclui-se que de fato a problemática da vacinação associada a desinformação não tem fácil solução (ainda mais quando as autoridades do país endossam a fabricação de notícias falsas). Mas fica claro que cabe uma autocrítica da comunidade científica para facilitação na comunicação com mais tipos de públicos bem como cabe maior atenção do governo para maior valorização das produções acadêmicas, acesso a mais tipos de informações e incentivo aos ambientes de apropriação do conhecimento como as escolas, universidades, bibliotecas e outros ambientes culturais.


Juliana Mendes Santiago - Estudante de Biblioteconomia (ECA/USP)




Referências


CONSPIRAÇÃO Antivacina. Direção de Colette Camden. Reino Unido: Caravan Media, 2021.

DIAS, Luiz Carlos. Movimento antivacinas: uma séria ameaça à saúde global. Jornal da UNICAMP, São Paulo. 21 set. 2020. Disponível em: https://www.unicamp.br/unicamp/ju/artigos/luiz-carlos-dias/movimento-antivacinas-uma-seria-ameaca-saude-global. Acesso em: 14 mar. 2022.


ERMAN, George. Da varíola à covid-19, a história dos movimentos antivacina pelo mundo. BBC Brasil, [S.I.] 15 jan. 2022. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-59867755. Acesso em: 14 mar. 2022.


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