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A periferia em Sabotage

Sabotage: O Maestro do Canão é mais do que apenas sobre um rapper, é sobre a periferia em si



#PraCegoVer [ILUSTRAÇÃO]: À esquerda da imagem, Sabotage está em pé, de braços abertos e rosto inclinado para cima. Ao fundo, o céu escuro é iluminado pela lua, logo acima de Sabotage, e há casas de alvenaria, com seus tijolos à vista, em tons marrons e avermelhados. Fonte: Alexandre de Maio, "Sabotage: O Maestro do Canão" (2015).


"Você quer saber o que é o rap nacional? Precisa ouvir Sabotage.” A frase de Paulo Miklos no documentário Sabotage: O Maestro do Canão (2015) é a síntese da obra que conta a vida, ascensão e morte de um dos maiores ícones do rap brasileiro, Mauro Mateus dos Santos Filho, o Sabotage, assassinado há 17 anos, em 24 de janeiro de 2003 na zona sul paulista.


Mais que um documentário, o longa do diretor Ivan Vale Ferreira é um retrato do músico que era Sabota. Não há a preocupação em expor envolvimento do rapper com o tráfico antes de encontrar sua redenção na música. Em momento algum, a obra cai na armadilha de recorrer a um ambiente violento para facilitar a identificação do público. Não é como se isso fosse ignorado, só não tem relevância para a obra. Sabotage era muito mais do que ex traficante, bem como que a periferia é muito do que sua violência


Em momento algum, porém, o documentário nega o ambiente que construiu o que foi Sabotage. Criado só pela mãe depois do abandono paterno, o irmão preso e depois morto, o envolvimento com o crime, tudo isso está ali, mas não é nada disso que fez do rapper o que ele era. Seu som o definia, não a violência. Da mesma forma acontece com a periferia. Seu som, suas cores, sua cultura, tudo isso é mais presente nas suas vielas, nas suas ruas do que o medo, mesmo que só o medo acabe na capa do Estadão.


Dessa maneira, o artista era uma espécie de amálgama de seu ambiente. Sofria preconceito daqueles que o viam com um bandido, uma praga a ser exterminada, ao mesmo tempo em que era objeto de fascínio e estudo dos “descontruidões da zona sul”, que, já naquela época, viam-se de forma paternalista em relação aos ditos menos favorecidos. Sabotage era a arte da perifa, que tinha orgulho de ser perifa. Tal qual seu ambiente, vivia em um fogo cruzado de sinhá e sinhozinhos que, ou almejavam pela volta do tronco e da casa grande, ou visitavam a senzala com panos e curativos, mas mantendo os grilhões.


17 anos se passaram desde o assassinato de Sabotage. O estilo que ele revolucionou com apenas um álbum de estúdio, Rap é Compromisso (2000), se popularizou pagando o mesmo o preço que o samba, o funk. Para ir para as rádios, para os programas de domingo à tarde, tiveram que ser embranquecidos, elitizados, suavizados. Entretanto, vendo O Maestro do Canão, temos certeza de duas coisas: que Sabotage jamais iria aparecer no Faustão e que era exatamente isso que o fazia tão fantástico. Em cada depoimento, em cada fala, em cada instante a figura que vemos na tela é de resistência. Sabota é a perifa e a perifa é o Sabota.


Rafael de Paula

Graduando em Ciências Sociais (FFLCH-USP) e bolsista do Projeto CineGRI

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