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122 itens encontrados para ""

  • O genocídio dentro do genocídio: quem são aqueles que deixam de respirar na pandemia?

    #PraCegoVer [FOTOGRAFIA]: Ao fundo, homens negros fazendo referência ao corpo dos jovens negros mortos e desaparecidos. No centro, Maurício (interpretado por Juan Paiva), personagem principal do filme "M-8: quando a morte socorre a vida", 2021. Fonte: https://www.adorocinema.com/filmes/filme-266428/ O filme M-8: Quando a Morte Socorre a Vida (2021), dirigido por Jeferson De, nos conta a história de um jovem negro chamado Maurício, recém egresso do curso de Medicina em uma Universidade Pública do Rio de Janeiro. A trama se desenrola a partir da relação do jovem com um defunto de pele negra, igual a Maurício, um corpo sem vida, marcado pela identificação burocrática e fria de "M-8". O filme trata sobre processos de genocídio dos jovens negros no Brasil, possibilitando uma reflexão sobre o contexto atual de pandemia e o genocídio que está sendo potencializado no Brasil e nos países de capitalismo periférico, que estruturalmente têm menos recursos para compras de insumo, medicamentos, equipamentos e vacinas para sua população. Maurício é um dos únicos negros da Universidade, e é interpelado, ou melhor, apontado pelo estigma de ser um negro nesses espaços brancocêntricos. O único lugar no qual ele se sente entre seus iguais é entre os funcionários da universidade e com os defuntos usados como estudo na aula de anatomia, dentre eles o cadáver de um jovem negro identificado como M-8. A narrativa do filme se desenrola na tentativa do jovem de saber mais sobre o tal cadáver que o assombra, e, nessa busca, Maurício descobre que M-8 faz parte de um incontável número de jovens pretos desaparecidos. Durante essa procura, o protagonista se depara com um grupo de mulheres negras protestando e rogando pelo retorno de seus filhos, mesmo que estivessem sem vida, pois a dor de não saber onde estão e de não poder enterrar seus mortos é imensurável. Paralelamente, a realidade brasileira de 2021, apesar de nos deixar encontrar os corpos, nega a possibilidade de velá-los e enterrá-los dignamente, com o avanço da pandemia e a superlotação dos necrotérios e dos cemitérios. Nas últimas semanas, o Brasil alcançou a marca de 300 mil mortos pelos números oficiais, com uma quantidade de mortes diárias jamais antes vista, chegando a 3 mil. Com os cemitérios entrando em colapso em todos os Estados brasileiros, já foram encomendadas câmaras frigoríficas para empilhar os corpos. E a pergunta que fica é: de quem são esses corpos, de onde vieram e qual é cor deles? #PraCegoVer [FOTOGRAFIA]: na imagem, o cadáver denominado no filme de M8 (Raphael Logam). Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=uk_rvigyFiQ&ab_channel=ParisFilmes Ao contrário do que foi anunciado no início da pandemia, há um ano, o vírus não é democrático, ele tem classe, CEP e cor de pele [1], e, não por acaso, a primeira vítima em uma das mais importantes cidades do Brasil foi uma mulher preta, empregada doméstica [2], contaminada por sua patroa que contraiu o vírus ao voltar de uma viagem do exterior. Após o vírus sair do Leblon e Morumbi, ele segue avançando pelas comunidades mais pobres do Brasil, onde a pele em sua grande maioria não é alva, e sim pele alvo. Muitos M-8s começam a se empilhar nas valas comuns, e os números quase nos impedem de contar seus nomes e suas histórias. Os protocolos sanitários não permitem que os mortos tenham um enterro digno, algo presente desde os primórdios do nosso processo de socialização enquanto humanidade. Também se engana quem pensa que esse genocídio em curso tem a ver somente com um vírus agressivo, como nos afirma Alysson Mascaro: No fundamental, a dinâmica da crise evidenciada pela pandemia é do modelo de relação social, baseado na apreensão dos meios de produção pelas mãos de alguns e pela exclusão automática da maioria dos seres humanos das condições de sustentar materialmente sua existência, sustento que as classes desprovidas de capital são coagidas a obter mediante estratégias de venda de sua força de trabalho. O modo de produção capitalista é a crise. [...] O flagelo do desemprego, as habitações precárias para suportar quarentenas, as contaminações em transportes públicos lotados e a fragilidade do sistema de saúde são, exata e necessariamente, condições históricas de um modo de produção específico, o capitalismo. (MASCARO, 2020) Algo que completa a afirmação do grande sociólogo brasileiro Darcy Ribeiro, "o Brasil é uma máquina de moer gente", é: de moer gente preta. A crise, o morticínio e o genocídio no Brasil que criaram esses empilhamentos de M-8s têm relação com a própria história do processo de construção desse país, na estruturação do modo de produção capitalista. E o joelho do capital nascido do navio negreiro ainda pressiona os pescoços da classe trabalhadora preta e pobre, que agora morre sufocada sem respirar nas filas dos hospitais aguardando um leito. E a pergunta retórica que fica é: incompetência ou projeto político? Willian Marcos Antonio Silva Graduando em História pela FFLCH-USP #COVID-19 #M-8 #GENOCÍDIO Referências Bibliográfias: [1] JUNIOR, Gonçalo. Risco de morte de negros por covid-19 é 62% maior, diz Prefeitura de SP. Disponível em: . Acesso em: 18/abril/2021. [2] MELO, MARIA. Primeira vítima do RJ era doméstica e pegou coronavírus da patroa no Leblon. Disponível em: . Acesso em: 19/abril/2021. MASCARO, Alysson. Crise e Pandemia. São Paulo: Boitempo, 2020.

  • #StopAsianHate e identidade: o retrato do amarelo nascido no continente americano

    #PraCegoVer [Fotografia]: pessoas protestam com placas em grande cidade contra o racismo direcionado aos asiáticos. Fonte: https://www.indy100.com/news/asian-hate-crimes-new-yorker-b1825037 O ódio e os ataques contra amarelos infelizmente estão se tornando cada vez mais comuns em diversos países ocidentais, especialmente nos Estados Unidos. Autorizados pelo discurso xenofóbico do ex-presidente Donald Trump, o qual diversas vezes se referiu ao coronavírus como “china vírus” e “kung-flu” (kung-febre), notícias de asiáticos sendo vítimas de agressão física, verbal e até homicídios começaram a configurar com frequência nos grandes noticiários do país. Recentemente, no dia 16 de março na cidade de Atlanta, nos Estados Unidos, um homem branco de 21 anos invadiu três casas de massagem e deixou oito mulheres mortas, seis delas descendentes de asiáticos. Perfis de redes sociais do atirador expunham postagens em que o jovem compartilhava discursos de ódio racial, como uma camiseta com os dizeres “Covid-19: vírus importado da China”. Desde então, diversos protestos por todo o Estados Unidos e pelo resto do mundo se espalharam, juntamente com o movimento #StopAsianHate. O medo #PraCegoVer [Ilustração]: Capa de revista. Em uma estação de metrô, uma mulher asiática segura a mão de sua filha pequena enquanto esperam o trem chegar na plataforma. A mãe olha para o relógio atentamente enquanto a filha observa se tem alguém por perto. Fonte: https://www.newyorker.com/culture/cover-story/cover-story-2021-04-05 A importante revista de críticas e ensaios estadunidense New Yorker tem como capa do dia 5 de abril de 2021 uma ilustração que retrata o novo estágio de preocupação de todos os asiáticos e asiático-americanos residentes dos Estados Unidos: o temor pela própria vida e segurança e o impacto psicológico causado com a onda de ódio em que o país vive. Movimentos de resistência A organização Stop AAPI Hate é uma organização que monitora os casos de violência contra asiáticos, asiático-americanos e habitantes das Ilhas do Pacífico no mundo, mas principalmente nos Estados Unidos, onde surgiu. Consumir coisas da cultura asiática, mas não ter empatia pelos asiáticos é uma questão muito abordada pelos movimentos de resistência, que discutem como a desumanização dos corpos asiáticos ocorre pela branquitude que utiliza de estereótipos para sustentar a exploração de mão-de-obra barata dos países dos Tigres Asiáticos, por exemplo. Ouvir k-pop, assistir anime, ler mangá, vestir-se inspirados na moda asiática e comer comida asiática, mas fazer piadas utilizando dos estereótipos e da aparência física é uma forma de violência que invisibiliza o indivíduo, transformando-o apenas em um produto conveniente ao modelo econômico neoliberal. Minari #PraCegoVer [Fotografia]: Pôster de filme. Pai segura a mão do filho pequeno que segura a mão da irmã mais velha que segura a mão da mãe. Estão em um gramado, o menino mais novo sorri, enquanto pai e irmã olham para baixo e a mãe olha para para o lado. Ao fundo, vemos pintada na parede da casa a bandeira desbotada dos Estados Unidos. Fonte: https://a24films.com/films/minari Na corrida para o Oscar de 2021, Minari é um filme estadunidense dirigido pelo diretor Lee Isaac Chung, no qual acompanhamos uma família de imigrantes coreanos em busca do tal “sonho americano”. A dinâmica da família acaba se transformando drasticamente com a chegada da avó da Coreia do Sul. O ator Steven Youn, que protagoniza o longa, é o primeiro asiático-americano a ser indicado ao prêmio de melhor ator no Oscar em 93 edições. Confundido por muitos como um filme coreano (inclusive foi indicado erroneamente como melhor filme estrangeiro no Globo de Ouro), Minari é um filme estadunidense feito por asiáticos-americanos e coreanos, narrando essa história tão particular que pertence a muitas famílias que migraram em busca de oportunidades em outros países. Ser asiático-americano #PraCegoVer [Fotografia]: Criança está de pé olhando para a avó, que está sentada no chão. Eles se encaram. Estão dentro de casa e é dia. Fonte: https://a24films.com/films/minari A partir do caçula da família, David (Alan Kim), a identidade asiático-americano entra em discussão. O pai durante todo o longa tenta plantar nas terras estadunidenses vegetais coreanos, exemplificando a condição do imigrante que luta em mesclar os dois mundos que formam sua existência. O único da família nascido nos Estados Unidos, David, simboliza através dos embates com a avó, figura anciã que acaba de vir da Coreia do Sul, a condição do asiático-americano. David, apesar de ser filho de coreanos, é estadunidense. Entender sua existência neste espaço entre Coreia do Sul e Estados Unidos é complicado. “Você não é uma avó de verdade”, diz David em um ponto do filme. Mais adiante, a avó responde ao neto: "Você é o menino mais forte que a vovó já viu”. David, que até então combatia essa figura representante da Coreia, aceita enfim seu lugar nos braços dela. Eis o dilema de ser filho de imigrantes tão bem retratado no filme: a eterna condição de estrangeiro, seja no continente americano, seja no continente asiático. E no Brasil? De acordo com o IBGE, cerca de 1,1% da população se autodeclara como amarela, sendo a maior parte de origem japonesa devido à imigração que iniciou-se em 1908, ao chegarem em Santos, no estado de São Paulo. Desde então, o Brasil é o país que abriga a maior comunidade japonesa fora do Japão. Chineses também marcam presença significativa no país, sendo o Brasil o país que mais abriga chineses na América Latina, com cerca de 380 mil pessoas, com presença predominante no estado de São Paulo. A xenofobia contra asiáticos no Brasil não é novidade. Piadas com lojistas chineses e restaurantes e lanchonetes de origem asiática são comuns (quem nunca ouviu alguém comentar que a carne é feita de gato ou de morcego em algum estabelecimento cujo donos são asiáticos?), assim como bullying em ambientes escolares e corporativos com comentários com a estatura; o formato dos olhos, a textura do cabelo e até o suposto formato anatômico dos órgãos genitais e suposições acerca de habilidades intelectuais e comportamentais, fatores que compõem o mito da “Minoria modelo”. É importante sempre ressaltar a pluralidade que forma os asiáticos e descendentes de asiáticos e compor a luta antirracista, tão conveniente à branquitude. Marcela Sayuri estuda Letras Português-Japonês na FFLCH-USP. #StopHateAsian #imigração #asiáticoamericanos #imigrantes Referências Bibliográficas: We Need To Talk About Anti-Asian Hate: https://www.youtube.com/watch?v=14WUuya94QE&t=1875s Cor ou raça. IBGE. Disponível em: . Acesso em: 31 de abril de 2021. WERNER, Luciana. Ódio e preconceito contra asiáticos crescem no Brasil e nos EUA. Projeto Colabora, 25 de maio de 2020. Disponível em: . Acesso em: 31 de abril de 2021. Onda de ataques a asiáticos aterroriza comunidades nos Estados Unidos. Carta Capital, 25 de março de 2021. Disponível em: . Acesso em: 31 de abril de 2021. Stop AAPI Hate. Disponível em: . Acesso em: 31 de abril de 2021.

  • ‘Stop Asian Hate’ e o racismo enquanto política de Estado

    No dia 16 de março de 2021, ataques simultâneos assombraram o estado da Geórgia, nos Estados Unidos. Um homem armado abriu fogo em três casas de massagem, localizadas no condado de Cherokee e Atlanta. Das oito vítimas fatais, seis eram mulheres de origem asiática, fato que evidencia a natureza xenofóbica e racista do ataque terrorista. Desde o início da pandemia global de Covid-19, podemos observar uma tendência crescente de ataques de ódio direcionados à comunidade asiática em todo o mundo. Nos Estados Unidos, discursos racistas proferidos pelo ex-presidente Donald Trump determinam o tom dessas agressões. Por diversas vezes, o político norte-americano usou, de maneira mal-intencionada, o termo “vírus chinês”, em uma tentativa de atribuir a culpa da pandemia ao país asiático, argumento absolutamente desmistificado pelas autoridades científicas, sobretudo, por seu teor racista. Todo esse contexto de escalada do racismo deu origem ao “Stop Asian Hate”, uma campanha coordenada em defesa da população de origem asiática que vive nos Estados Unidos. Protestos populares, fundos de arrecadação e ações nas redes sociais têm se intensificado, em um esforço de levar informação e contrapor os ideais preconceituosos difundidos constantemente. Esse panorama nos permite atestar que o racismo contra a população asiática é algo incontestável, por isso, devemos nos questionar sobre as origens desse pensamento. Será que a pandemia serviu apenas para intensificar esse movimento de discriminação? A resposta para esta pergunta é parte fundamental do enredo de “Minari” (Lee Isaac Chung, 2020). O filme conta a história de uma família coreano-americana, que se muda da Califórnia para uma fazenda no Arkansas, em uma tentativa de se estabelecer financeiramente. Jacob (Steven Yeun) e Monica (Han Ye-ri) trabalham em situação de subemprego numa granja local, enquanto lutam para criar seus filhos Anne (Noel Cho) e David (Alan S. Kim), que sofre de uma doença no coração. A produção trata de temas importantes como identidade, resistência, racismo e assimilação cultural. A avó Soonja, interpretada com maestria por Yoon Yeo-jeong, tem um papel fundamental ao evidenciar os conflitos étnicos-culturais, em seu esforço para se aproximar e entender o estilo de vida de sua família, agora sob solo norte-americano. A jornada de Jacob (Steven Yeun), que tenta a todo custo prosperar e se tornar um homem bem sucedido na década de 80, ajuda a subverter o ideal do "sonho americano” e de uma “América para todos”. Todos os obstáculos e dificuldades enfrentadas pela família são marcas das tensões de um país onde a desigualdade social opera nos campos de classe, raça e gênero. O contexto de violência racial contra a população asiática nos Estados Unidos tem registros históricos muito antigos. A lei promulgada em 1882, que proibia a imigração indianos, filipinos, coreanos e outros países de origem asiática, sob o argumento de resguardar os empregos no país, só evidencia que esse preconceito age de forma sistêmica, evoluindo no decorrer dos anos. No Brasil também podemos observar um panorama similar, com um discurso racista que culpabiliza a China pela pandemia, endossado por figuras do alto escalão de governo, como o presidente Jair Bolsonaro, o ex-Ministro da Educação Abraham Weintraub e o ex-Ministro de Relações Exteriores Ernesto Araújo. Atos que incentivam o ódio racial e evidenciam a manutenção de uma lógica discriminatória, observada em grande parte do Ocidente. É urgente a necessidade de contrapor esses discursos racistas em um esforço conjunto de combate à campanha de desinformação difundida. Neste sentido, é muito importante destacar cada vez mais a cultura específica de todos os países do continente Asiático, dando voz, protagonismo e respeitando o local de fala deles. As soluções para essa questão só podem ser elaboradas quando os locais de poder e diálogo são divididos com aqueles diretamente atingidos pelo preconceito. Plataformas como o “Stop Asian Hate” são um exemplo importante e devem ser cada vez mais difundidos para o alcance de uma reparação histórica. #PraCegoVer [Fotografia]: O personagem Jacob está de camisa bege xadrez e calça jeans azul, abraçado com sua filha Anne que veste um vestido bege. Ela está de mãos dadas com seu irmão David, que está no centro da fotografia. Ele veste uma camisa com listras branca, laranja, azul e bege, além de estar sorridente. David também está de mãos dadas com sua mãe, Monica, que veste camisa rosa e uma saia jeans. Ao fundo vemos uma casa com uma bandeira dos Estados Unidos que cobre toda a sua frente e tem árvores ao seu redor. Fonte: https://www.agazeta.com.br/amp/colunas/rafael-braz/indicado-a-6-oscar-minari-e-otimo-drama-sobre-familia-e-identidade-0421 Yan Carvalho - Ciências Sociais USP #stopasianhate #xenofobia #racismo #ásia #minari Referências Bibliográficas: PADILHA, Alice. ‘Stop Asian Hate’: Entenda o que é e como ajudar o movimento. GQ Globo, 2021. Disponível em: . Acesso em: 15 de abril de 2021 Suspeito de ataques a casas de massagem nos EUA planejava ação semelhante na Flórida. G1, 2021. Disponível em: . Acesso em: 15 de abril de 2021 ORAZEM, Eloá. Ódio contra asiáticos não é novidade nos EUA, e cresce com pandemia. Brasil de fato, 2021. Disponível em: . Acesso em: 15 de abril de 2021

  • Eu só quero é ser feliz

    #PraCegoVer [Montagem]: A imagem retrata diversos jovens em um baile nos anos 80. No centro da imagem, está escrito “Eu só quero é ser feliz - uma breve história do funk carioca”. Fonte: https://www.anf.org.br/anf-20-anos-documentario-eu-so-quero-e-ser-feliz-uma-breve-historia-do-funk-carioca/ Em março desse ano, a Polícia Civil do Rio de Janeiro pediu a prisão de diversos funkeiros, como MC Poze do Rodo e MC Negão da BL, por associação ao tráfico de drogas e infração de medidas sanitárias. A operação policial no Rio não é um caso isolado. Em São Paulo, mandados de busca e apreensão foram emitidos contra MCs paulistas, em uma investigação sobre tráfico de drogas e associação ao tráfico. A perseguição do funk e da cultura da periferia não é novidade. Desde sua criação nos anos 80, os “bailes de corredor” eram frequentemente invadidos pela polícia e os artistas detidos. O curta-documentário “Eu só quero é ser feliz - uma breve história do funk carioca” (André Fernandes, 2016), disponível no canal do Youtube da Agência de Notícias das Favelas [https://www.youtube.com/watch?v=sZ8h_C4ArhY], conta a história e origem do funk que, nascido nas comunidades do Rio de Janeiro, começou com versões brasileiras de músicas estrangeiras. O diretor entrevista artistas como MC Marlboro, MC Galo, MC Geléia e muitos outros pioneiros do funk. O ritmo inicialmente era tocado nos clubes, mas, como já indicava a letra “É som de preto, de favelado”, o funk logo começou a ser perseguido e os clubes de bairro que tocavam os sucessos da comunidade eram fechados ou tinham seu alvará de funcionamento cassados. Assim o funk foi expulso do asfalto e "confinado” no morro. A polícia e o próprio Estado trabalhavam e ainda hoje trabalham contra o lazer e cultura da periferia, dificultando o acesso aos bailes, perto de onde até mesmo motoristas de ônibus são orientados a não parar. A favela e favelado sempre foram retratados na mídia como sinônimos de violência, perigo e ameaça. O funk vem para subverter essa imagem e levantar a autoestima das comunidades, exaltando as belezas e mostrando que, apesar dos problemas, a comunidade não é apenas aquilo que passa nas novelas e jornais. No documentário Cidinho e Doca, os donos dos sucessos Rap da Felicidade e Rap das Armas contam que foram convocados a prestar esclarecimento em uma delegacia sobre a letra de sua última música. Frequentemente as letras que falam sobre o cotidiano dentro das comunidades são relacionadas com a apologia ao crime, mas elas retratam nada mais do que a realidade e o dia-a-dia das favelas. #PraCegoVer [Imagem]: à esquerda um homem usando uma camisa branca, segurando uma câmera gravando dois homens negros: o do meio usa uma blusa com a frase “eu só quero é seu feliz”; o homem à direita utiliza óculos escuros e uma camiseta amarela, com detalhes em vermelho e preto. Fonte:https://www.anf.org.br/documentario-da-anf-conta-os-primeiros-anos-do-funk-carioca/ Desde sua criação o funk é criminalizado, mas o ritmo das favelas é mais do que um estilo de música, é uma forma de dar voz e oportunidade a milhares de pessoas que vivem as mesmas situações e se identificam com essa realidade. A cultura que nasce na periferia não é menos importante do que aquela consumida pelas classes dominantes, ela reflete a vida de um povo que tem sonhos, direitos e, como no título do filme e da música, só quer ser feliz. Gabriela Bucalo Bolsista CineGRI e Graduanda em Geografia FFLCH-USP #funk #cultura #periferia #riodejaneiro #música Referências bibliográficas: BREDÂ, Lucas. Tensão entre o funk e a polícia vive novo auge com caso do MC Poze do Rodo. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2020/07/tensao-entre-o-funk-e-a-policia-vive-novo-auge-com-caso-do-mc-poze-do-rodo.shtml Acesso em: 18 de Abril de 2021 GOUVEIA, Julianne. Documentário da ANF conta sobre os primeiros anos do funk carioca. Disponível em: https://www.anf.org.br/documentario-da-anf-conta-os-primeiros-anos-do-funk-carioca/ Acesso em: 20 de Abril de 2021 SILVA, Fabio. Filme sobre história do funk é lançado no Dia dos Direitos Humanos. Disponível em:https://www.anf.org.br/filme-sobre-historia-do-funk-e-lancado-no-dia-dos-direitos-humanos/ Acesso em: 20 de Abril de 2021

  • O mundo é diferente da ponte pra cá

    Da Ponte Pra Cá é uma das letras mais famosas que compõem o álbum “Nada Como um Dia Após o Outro Dia” do Racionais Mc 's, um grupo brasileiro de rap que surgiu no final da década de 80 e marcou gerações posteriores com suas letras que trazem reflexões sobre a vida dos paulistanos periféricos da cidade de São Paulo. Além disso, suas canções sintetizam muito bem a percepção da comunidade e sua relação com o mundo. Abordar o tema da periferia e discutir a criminalização da cultura periférica, incluindo o rap e o funk é, acima de tudo, compreender a nossa relação histórica com as medidas de repressão às manifestações da cultura e religiões de matriz negra ou africana, que representam uma cicatriz aberta do período escravagista. O que podemos observar desde o Brasil colônia é a manutenção da violência praticada pelo Estado na tentativa de impedir a ocupação de pessoas negras no espaço público. No documentário Racionais Mc’s – 1000 Trutas 1000 Tretas, dirigido por Ice Blue, Mano Brown, Roberto T. Oliveira e João Wainer, conhecemos a trajetória do grupo de rap Racionais Mc’s, que marcou gerações com suas letras que revelam o sofrimento, a violência, o racismo e a precarização das condições de vida na periferia. A narração é feita por Brown. Ele nos conta sobre o surgimento dos bailes black em São Paulo, manifestação artística que esteve ligada ao período pós abolição e também à tentativa do Estado brasileiro de criminalizar a cultura do negro e do afrodescendente. Nesse sentido, observamos o surgimento de práticas culturais que resistiram e se transformaram ao longo do anos. #PraCegoVer: Cena do show feito pelo Racionais Mc's, no primeiro plano da foto temos o rapper Mano Brown cantando. Fonte: https://bit.ly/2PZvcDN Embora o documentário tenha o maior foco no Hip-Hop, Black e Rap, também conseguimos compreender as manifestações artísticas que antecederam o funk. Como diz a letra “Ponta de Lança” do rapper Rincon Sapiência, “música preta a gente assina, funk é filho do gueto, assuma". Essa frase revela o significado da caracterização social e a formação das favelas brasileiras no período pós-abolição. Não existiu projeto de lei para assegurar boas condições de vida às famílias dos recém libertos, o que existiu foi a marginalização e a violência para a população negra desse país. A matéria produzida pelo El País, no dia 07 de dezembro de 2019, nos recorda sobre a violência e a repressão que se forma contra o funk no trecho: "Basta ir a um baile —ou fluxos, como são conhecidos— nas periferias de São Paulo para estar sujeito a tiro, porrada e bomba". Foi o que aconteceu na madrugada do dia 1º, quando uma ação da Polícia Militar na festa conhecida como DZ7, em Paraisópolis, terminou com nove jovens mortos pisoteados depois de serem encurralados pela tropa. O funk expandiu, foi para as plataformas digitais e invadiu as festas das elites brasileiras, mas é uma prática criminalizada no seu lugar de nascimento. Mesmo após as letras do Racionais Mc’s na década de 90 até anos 2000, diversos outros artistas oriundos de espaços periféricos ainda sofrem com a discriminação herdada do período da escravidão, prática que é mantida pelo Estado até hoje, como revela a matéria publicada pelo El País. A música transcende as barreiras, porém o mundo permanece diferente da ponte pra cá. Produzimos arte para divertir a "playboyzada", mas seguimos sofrendo com a violência diária cometida pelas políticas racistas e genocidas desse país. Amanda Escobar Costa Graduanda em História (FFLCH-USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2020-2021. #racionais #funk #cultura #periferia #rap #hiphop #música Referências bibliográficas: ALESSI, GIL. Do samba ao funk, o Brasil que reprime manifestações culturais de origem negra e periférica. Disponível em: https://brasil.elpais.com/sociedade/2019-12-07/do-samba-ao-funk-o-brasil-que-reprime-manifestacoes-culturais-de-origem-negra-e-periferica.html Acesso em: 15/04/2021 A Criminalização Do Funk VIOLA, KAMILLE . A Criminalização Do Funk. Disponível em: https://revistatrip.uol.com.br/trip/a-criminalizacao-do-funk Acesso em: 15/04/2021 RACIONAIS MC’S – 1000 TRUTAS 1000 TRETAS: http://lisa.fflch.usp.br/node/2050. Acesso em: 15/04/2021 O FUNK CONSCIENTE E AS POLÍTICAS ECONÔMICAS BRASILEIRAS: https://www.youtube.com/watch?v=y8vs5FrpMww. Acesso em: 15/04/2021

  • A Trúfula Perdida e a Questão Ambiental no Brasil

    Eu não percebo onde tem alguma coisa que não seja natureza. Tudo é natureza. O cosmos é natureza. Tudo em que eu consigo pensar é natureza. (KRENAK, 2019, p. 10) #PraCegoVer [ANIMAÇÃO]: No centro da imagem, o personagem Umavez-ildo corta um tronco de trúfula (espécie de árvore). Ele veste um chapéu cinza, uma blusa branca, um colete cinza, uma calça cinza listrada e luvas verdes. Além disso, ele segura um machado com as duas mãos. Atrás de Umavez-ildo, pequenos ursos e aves o observam. O fundo é composto por diversas trúfulas nas cores laranja, amarela, vermelha e roxa. Fonte: http://www.contracenarte.com/2012/04/o-lorax-uma-licao-para-humanidade.html Na cidade de Thneedville, a vida é perfeita (e artificial). Árvores coloridas de mentira, flores de plástico e galões de ar puro enlatado compõem o cenário aparentemente divino que oculta uma história de progresso, ganância e consumismo. Tudo começa com o personagem Umavez-ildo (Ed Helms), que encontra por acaso uma floresta de trúfulas, uma espécie de árvore macia e colorida. Deslumbrado com a possibilidade de riqueza, Umavez-ildo começa a cortar as plantas para produzir um produto milagroso chamado sneed, abalando permanentemente o ecossistema. Anos depois, o jovem Ted (Zac Efron) procura Umavez-ildo para descobrir a verdadeira história sobre as extintas árvores e, após muitos empecilhos, consegue plantar a última semente de trúfula que ainda resta. Por meio da ação de Ted, os moradores de Thneedville finalmente compreendem a importância da natureza e o equilíbrio é restaurado. A história descrita acima constitui o enredo do filme O Lorax: Em Busca da Trúfula Perdida (Chris Renaud, 2012). Infelizmente, o Brasil não possui uma semente de trúfula milagrosa capaz de solucionar os problemas ambientais existentes. Apesar da rica biodiversidade, o país se encaminha para um futuro semelhante ao de Thneedville: o Brasil está entre os 15 países que mais emitiram CO2 em 2019 [1] e lidera o ranking mundial dos países com maior perda florestal entre 2010 e 2020 [2]. Ainda está em tempo de salvar a fauna e a flora brasileiras, mas são necessárias ações urgentes e mudanças drásticas. Sendo assim, entender o atual panorama brasileiro é o primeiro passo em direção à conscientização. Sem dúvidas, a Amazônia Legal constitui uma das áreas mais ameaçadas do país. Segundo dados do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), o desmatamento na região vem aumentando por três anos consecutivos. No gráfico abaixo, é possível ter uma dimensão melhor da devastação: Muitas vezes feito de maneira ilegal, esse processo acarreta grandes prejuízos ao meio ambiente. Perda de espécies nativas, desertificação e exaustão do solo são apenas alguns dos problemas causados pelo desflorestamento. Afinal, por que há tanto interesse em devastar a Amazônia? Em geral, a cobertura vegetal é retirada para ceder espaço às atividades econômicas, como a plantação intensiva de soja. Maior produtor do país, o Mato Grosso coincidentemente (ou não) apresentou uma das mais altas taxas de desmatamento em 2020 entre os estados integrantes da Amazônia Legal. Embora existam narrativas conflitantes, o cultivo de soja em área devastada é incentivado pela sensação de impunidade e pelos lucros elevados. Infelizmente, os fatores econômicos predominam sobre a preocupação ambiental com frequência. Além disso, o Pantanal é outro bioma brasileiro que tem ganhado espaço na mídia. Entretanto, a notoriedade é decorrente de acontecimentos indesejáveis. Como não lembrar das manchetes jornalísticas anunciando as recentes queimadas na região? Em 2020, a quantidade de focos de incêndio registrada foi a maior desde 1988 [3]. Os números alarmantes parecem quase paradoxais à natureza do Pantanal, maior área úmida da Terra. Por sinal, nem mesmo os rios estão seguros no “reino das águas”. O assoreamento do Rio Taquari, por exemplo, ilustra a situação de forma exemplar. Em virtude das pressões humanas, o curso d’água rompeu suas margens e alagou permanentemente áreas de terra. Assim, famílias foram privadas de seu sustento, pessoas ficaram desabrigadas e animais perderam seu habitat natural. Essa triste situação é representada na obra Ruivaldo, o Homem que Salvou a Terra (Jorge Bodanzky e João Farkas, 2019). O quadro de devastação é tão extenso que se torna impraticável citar todos os problemas ambientais brasileiros neste texto. De qualquer forma, os exemplos mencionados acima são suficientes para soar um alerta quanto à insustentabilidade de nosso atual estilo de vida. Para evitar que o destino do Brasil seja semelhante ao de Thneedville, a sociedade precisa agir (e rápido). Júlia Cristina Buzzi Graduanda em Relações Internacionais (IRI-USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2020/2021. #Lorax #Natureza #Brasil #Amazônia #Pantanal Notas e referências bibliográficas: [1] CO2 Emissions. Global Carbon Atlas. Disponível em: < http://www.globalcarbonatlas.org/en/CO2-emissions > Acesso em: 16/ 03/ 2021. [2] FAO. Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura. Global Forest Resources Assessment 2020: Main report. Roma: FAO, 2020. Disponível em: < http://www.fao.org/3/ca9825en/CA9825EN.pdf > Acesso em: 16/03/2021. [3] HAJE, Lara. Inpe confirma aumento de quase 200% em queimadas no Pantanal entre 2019 e 2020. Agência Câmara de Notícias, 2020. Disponível em: < https://www.camara.leg.br/noticias/696913-inpe-confirma-aumento-de-quase-200-em-queimadas-no-pantanal-entre-2019-e-2020/ > Acesso em: 18/ 03/ 2021. A taxa consolidada de desmatamento por corte raso para os nove estados da Amazônia Legal (AC, AM, AP, MA, MT, PA, RO, RR e TO) em 2019 é de 10.129 km2. INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, 2020. Disponível em: < http://www.inpe.br/noticias/noticia.php?Cod_Noticia=5465 > Acesso em: 16/ 03/ 2021. KRENAK, Ailton. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: EDITORA SCHWARCZ S.A., 2019. Disponível em: < https://culturapolitica2018.files.wordpress.com/2019/09/ideias-para-adiar-o-fim-do-mundo.pdf > Monitoramento do Desmatamento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite. Coordenação Geral de Observação da Terra – INPE. Disponível em: < http://www.obt.inpe.br/OBT/assuntos/programas/amazonia/prodes > Acesso em: 16/ 03/ 2021. Soja em números (safra 2019/20). Portal Embrapa. Disponível em: < https://www.embrapa.br/soja/cultivos/soja1/dados-economicos > Acesso em: 18/ 03/ 2021. Taxas calculadas por imagem de satélite pós 2002. Coordenação Geral de Observação da Terra – INPE. Disponível em: < http://www.obt.inpe.br/OBT/assuntos/programas/amazonia/prodes/taxas-calculadas-por-imagem-de-satelite-pos-2002 > Acesso em: 16/ 03/ 2021.

  • Brasil: O país do desacordo ambiental

    #PraCegoVer: Fotografia de uma mulher usando máscara branca com uma mensagem escrita com tinta vermelha: “SOS AMAZONIA”. No fundo há uma movimentação de pessoas. Fonte: https://www.brasildefatopr.com.br/2019/08/29/queimadas-cresceram-82-no-brasil-em-relacao-a-2018 As políticas ambientais são conjuntos de normas, leis e ações públicas visando à preservação do meio ambiente em um território. No Brasil, essa prática só veio a ser adotada a partir da década de 1930. No entanto, esses acordos que envolvem diversas nações atualmente foram deixados de lado pelo Brasil, como resultado da falta de políticas públicas. Essa falta de amparo governamental é representada cinematograficamente no documentário “Amazônia Sociedade Anônima”, dirigido por Estevão Ciavatta. O drama produzido em 2019, ano anterior às queimadas da maior floresta tropical do mundo, apresenta o fracasso do governo brasileiro em proteger a Amazônia, índios e ribeirinhos. “Amazônia Sociedade Anônima” (2019) assombra como um déjà vu do que aconteceria posteriormente em 2020: uma tragédia nacional que foi um catalisador para deixar o Brasil de fora dos acordos ambientais com outros países. Vale lembrar que todas as questões ambientais que tomaram uma proporção maior no ano que iniciou a pandemia mundial já estavam em desequilíbrio em território nacional, como veremos nos dados a seguir: Os focos de calor predominaram e predominam na região Norte do país, dando ao Amazonas a colocação de 3º estado com mais queimadas, emissões e desmatamento. Esse problema levou o Brasil à lista de países que mais emitiram dióxido de carbono (CO2), o principal gás responsável pelo efeito estufa no mundo. Em época de seca na Amazônia e em outras zonas de florestas do Brasil, a mata torna-se suscetível a incêndios. Porém, no caso das queimadas vistas nos últimos meses, o fogo tem origem majoritariamente na ação predatória de fazendeiros em busca de expansão das áreas de pastagem ou para plantações de soja, por exemplo. Tudo isso contribuiu para que o país se tornasse uma ex potência climática e se afastasse cada vez mais das metas do acordo de Paris. Mas você sabe quais são essas metas e para que elas servem? O Acordo de Paris tem como principal objetivo reduzir as emissões de gases de efeito estufa para limitar o aumento médio de temperatura global a 2ºC, quando comparado a níveis pré-industriais. Essa medida é de suma importância pois a partir dela criam-se expectativas sobre medidas ambientais que impactam o mundo. Para que esses acordos sejam efetivos são realizadas reuniões com líderes de nações, como a “Climate Ambition Summit” (“Cúpula da Ambição do Clima”), que ocorreu em dezembro de 2020 e não contou com a presença brasileira, pois todos esses problemas ambientais concentrados na região Norte do país repercutiram negativamente no mundo e nos deram o título de grande poluidor mundial, junto com México e Estados Unidos. Essa repercussão revela algo muito além dos acordos em que o Brasil ficou de fora, pois tudo isso recai principalmente para a região Norte do país, que sofre com a falta de políticas públicas. Essa falta de amparo é citada no filme por depoimentos de ribeirinhos e ambientalistas, deixando nítido que, na verdade, o Brasil é o país do desacordo ambiental. Pâmela Vitória Graduanda em Letras (FFLCH-USP) e bolsista do Projeto CineGRI. #Acordos #Brasil #Amazônia #EfeitoEstufa #Ambiental #Queimadas Referências bibliográficas: CABRAL, Kempson. O que é o acordo de Paris? Disponível em: . (Acesso: 19/03/2021) MODELLI, Laís. Brasil fica de fora de evento da ONU que reúne países que anunciaram metas ambiciosas para redução de gases de efeito estufa. Disponível em: . (Acesso: 19/03/2021) Em 2020, fogo queimou a Amazônia, o Pantanal e a imagem do Brasil. Disponível em: . (Acesso: 20/03/2021) Queimadas impedirão o Brasil de honrar o Acordo de Paris, conclui estudo da UNEMAT e UFMS publicado na Nature. Disponível em: . (Acesso: 20/03/2021)

  • O abismo na educação

    #PraCegoVer [FOTOGRAFIA]: Duas meninas pré-adolescentes estão em bicicletas vermelhas em frente a um muro de uma escola municipal. Ao fundo, crianças observam a movimentação. Extraído de: https://globofilmes.globo.com/uploads/legado/filmes/104/galeria/prodianascerfeliz4.jpg Pro dia nascer feliz/O mundo inteiro acordar/E a gente dormir. Esse é o refrão da música do Barão Vermelho, eternizada na voz de Cazuza. Das interpretações possíveis, pro dia nascer feliz, alguém tem que estar trabalhando enquanto outros dormem. E quem trabalha, não surpreendentemente, faz parte das camadas mais vulneráveis da sociedade. Pro dia nascer feliz é um documentário de 2006 dirigido por João Jardim, que aborda a desigualdade na educação brasileira. Na primeira parte, o documentário expõe a realidade dos estudantes de Manari, interior de Pernambuco, fazendo contraposição na segunda parte com alunos de uma escola no Rio de Janeiro e de uma escola particular localizada no Alto de Pinheiros, o Colégio Santa Cruz, na cidade de São Paulo, ilustrando o abismo da diferença da educação do país. Em um país continental e de herança colonialista como o Brasil, não é de se surpreender que os índices de desigualdade sejam gritantes e que, obviamente, reflitam na educação pública. Em menos de dez minutos de filme, é exposto que o Censo escolar do MEC em 2004 marcava que das 210 mil escolas do país, 13,7 mil não possuíam banheiros, enquanto 1,9 mil não possuíam água. O que não se esperava era que, dezesseis anos depois da finalização do documentário, com a pandemia da Covid-19, a acentuação da desigualdade no âmbito escolar gritaria ainda mais intensamente, considerando que o número de evasão escolar se acentuou, ora pela dificuldade apresentada pelo ensino online ora pela falta de acesso à internet. Sendo assim, em 2020, os números do Censo escolar se encontram desta maneira: E quando falamos em educação, não falamos apenas de estudantes, mas de funcionários de escolas. Professores entrevistados para o documentário alegam o cansaço, o descaso do governo e a falta de manutenção do ambiente escolar que causam desmotivação. Uma das professoras diz: “Estamos vivendo a escola do século passado. Ela não cumpre mais a sua função. Tem que ser repensado.”. E o questionamento é: como tornar o ensino mais horizontal, atual e democrático enquanto todo o resto que permeia é exatamente o oposto desse sonho? E falando em sonho, quais são os sonhos dos estudantes? Quais as vontades, prioridades, realidades, quais as lutas? No documentário é nítido como essas questões mudam dependendo de seu lugar de origem. Um exemplo está nas preocupações das meninas do colégio paulistano de elite. Uma delas se queixou que não gostaria de dedicar seu tempo com caridade, pois isso atrapalharia o horário das aulas de natação. Outra disse que, por ser estudiosa, relacionou-se com apenas um menino durante o ano inteiro e se perguntou se isso a fazia ser menos mulher. Enquanto isso, as garotas do interior pernambucano possuem problemas que superam as vontades e dizem respeito à sua sobrevivência. Valéria, uma das meninas, diz que a acham estranha por gostar de ler. Que gostaria de ir à escola todos os dias, mas não pode, pois tem que ajudar com a renda familiar. Ao final, Valéria, a adolescente pernambucana, lê um poema que escreveu para a aula de português, perguntando qual o sentido da vida. E quem tem essa resposta? A angústia, afinal, é um sentimento universal. O que só muda são os motivos. Marcela Sayuri Graduanda em Letras (FFLCH) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2020-2021 #desigualdadesocial #educação #educaçãobrasileira #escolapública #documentáriobrasileiro Referências bibliográficas: Censo Escolar. Disponível em: http://censobasico.inep.gov.br/censobasico/. Acesso em: 23 de fevereiro de 2021. Pro dia nascer feliz (João Jardim, 2006). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=nvsbb6XHu_I&t=4024s. Acesso em: 23 de fevereiro de 2021. Pro dia nascer feliz. https://globofilmes.globo.com/filme/prodianascerfeliz/. Acesso em: 23 de fevereiro de 2021.

  • Brincando de médico

    #PraCegoVer: Imagem de cima de duas meninas brincando de “adoleta”, as duas estão sobre um gramado. Fonte: http://www.diariodecontagem.com.br/Materia/11763/21/museu-inima-de-paula-exibe-documentario-tarja-branca/ A educação é forjada de acordo com as concepções políticas e econômicas de seu respectivo momento histórico e o sistema educacional brasileiro não escapa à regra. Desde a década de 1970, tem sido o neoliberalismo uma das principais correntes ideológicas que norteiam a política, a economia e, por consequência, a educação. Adotado no Reino Unido por Thatcher em 1979 e nos Estados Unidos durante o governo Reagan em 1980, os ideais de livre comércio, valorização do trabalho e a visão de educação como uma mercadoria contaminaram praticamente todos os países da Europa Ocidental e Oriental durante as décadas de 1980 e 1990. Na América Latina, a doutrina neoliberal foi amplamente abarcada pela ditadura de Pinochet no Chile e, no Brasil, teve como grandes adeptos o presidente Collor, se fortalecendo no governo de Fernando Henrique Cardoso (FAGUNDES, 2017). A perspectiva neoliberal de educação, a qual privilegia a formação de cidadãos preparados para o competitivo mercado de trabalho, ignora propositalmente a importância da construção crítica do indivíduo e do desenvolvimento de sua criatividade e subjetividade. Esse movimento se mostra presente desde o início da educação básica, no ensino infantil, que tem como objetivos para seu público-alvo: “Conviver com outras crianças e adultos [...]; Brincar cotidianamente de diversas formas, em diferentes espaços e tempos, com diferentes parceiros [...]; Participar ativamente, com adultos e outras crianças, tanto do planejamento da gestão da escola e das atividades propostas pelo educador quanto da realização das atividades da vida cotidiana [...]; Explorar movimentos, gestos, sons, formas, texturas, cores, palavras, emoções, transformações, relacionamentos, histórias, objetos, elementos da natureza, na escola e fora dela [...]; Expressar, como sujeito dialógico, criativo e sensível, suas necessidades [...]; Conhecer-se e construir sua identidade pessoal, social e cultural [...]” (BRASIL, 2018, p.3, meu grifo) É a educação infantil a principal encarregada de construir a individualidade e o senso crítico do educando e é também, não aleatoriamente, a fase pedagógica mais menosprezada do ensino básico. Cada vez mais é alvo da escolarização precoce, através da antecipação da alfabetização e de outros conteúdos pertencentes ao ensino fundamental, e da desvalorização do brincar. É dentro dessa crítica que o belíssimo documentário “Tarja Branca – A Revolução que Faltava” (2014) se localiza. Mesclando cenas de brincadeiras e jogos com entrevistas com artistas, psicólogos e pedagogos, o longa-metragem, dirigido por Cacau Rhoden, é praticamente um manifesto de defesa do brincar. O filme mostra os benefícios da ludicidade na infância como forma de experimentação do mundo, desenvolvimento da autonomia e da criatividade e como ferramenta essencial da educação infantil. "Tarja Branca" questiona o avanço da constante necessidade de ocupar o tempo da criança com inúmeras atividades, pensando em "agilizar" seu processo de aprendizado e colocá-la na frente de outras na corrida por uma vaga no ensino superior e no mercado de trabalho. O documentário expõe a contaminação da infância e da educação básica pela competitividade neoliberal e propõe o brincar como “remédio tarja branca” para os grandes males da vida adulta na sociedade moderna, como a ansiedade e a depressão. Mariana Ramos Graduanda em Ciências Sociais (FFLCH – USP) e bolsista do Projeto CineGRI. #brincar #lúdico #educaçãoinfantil #neoliberalismo #tarjabranca Referências bibliográficas: BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018. FAGUNDES, K. C. A educação para o mercado de trabalho formando indivíduos alienados. Revista online de Política e Gestão Educacional, [S. l.], n. 9, 2017. DOI: 10.22633/rpge.v0i9.9277. Disponível em: https://periodicos.fclar.unesp.br/rpge/article/view/9277. Acesso em: 27 fev. 2021.

  • Geopolítica da vacina: apenas nos braços de países ricos

    O ano de 2021 começou conturbado em meio à crise mundial de saúde causada pela pandemia. As manchetes dos principais jornais mundiais trouxeram esperanças com a notícia da eficácia das vacinas Pfiser-BioNTech, Oxford-AstraZeneca e a CoronaVac, mas também trouxeram outros dilemas da nossa geopolítica. Foi dada largada na corrida pela vacinação, os países economicamente desenvolvidos garantiram seus estoques e compraram o dobro das doses. Segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), três a cada quatro vacinas contra Covid-19 estão em apenas dez países, o que revela as desigualdades sociais e os problemas econômicos enfrentados pelos emergentes. China, Índia, Rússia, Reino Unido e EUA desenvolveram suas próprias vacinas, o que facilitou o salto e a garantia da imunização dessas populações. Enquanto isso, segundo a matéria publicada em 22 de janeiro pelo Jornal Nexo, “39 milhões de doses de vacinas contra a covid-19 são divididas entre 49 países desenvolvidos, um país pobre recebe apenas 25 doses. Essa comparação foi feita pelo chefe da OMS (Organização Mundial da Saúde)”, ou seja, há uma profunda desigualdade entre países ricos e pobres no acesso à vacina. A dificuldade na distribuição e compra dessas doses causam um efeito preocupante, pois os números de contágios são cada vez mais altos e geram novas variantes e mutações do vírus, podendo colocar em risco a eficácia das vacinas desenvolvidas no mundo. #PraCegorVer [FOTOGRAFIA]: Cena do filme Bacurau em primeiro plano temos a frente de um caminhão com uma mulher sentada do lado esquerdo e um homem dirigindo o caminhão do lado direito. Fonte: https://www.bahianoticias.com.br/fotos/entretenimento_noticias/39401/IMAGEM_NOTICIA_5.jpg?checksum=1608045778 Como uma previsão do que estaria por vir ou apenas a leitura da realidade e das dificuldades no acesso a medicamentos e medidas preventivas de saúde, o filme Bacurau (Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, 2019) mostra na primeira cena o trajeto e os percalços da chegada da vacina na cidade de Bacurau, situação comum nos interiores esquecidos do Brasil, onde o acesso à saúde, educação, saneamento básico, entre outros problemas, são parte da desigualdade social no contexto nacional. Nesse sentido, é quase impossível não associar essa cena ao contexto atual: enquanto a vacina chega em alguns lugares do globo de avião, em outros lugares o transporte nem existe. No gráfico abaixo podemos observar o número de doses de vacina contra covid-19 já administradas: Abaixo, os países que já administraram vacinas contra a COVID-19: A matéria publicada em 21 de fevereiro de 2021 pelo jornal Folha de S. Paulo traz a reunião do G7, na qual o presidente da França (Emmanuel Macron) pressiona países ricos a enviar vacinas para África e outras regiões, o destaque foi para a fala de Joe Biden que disse “prioridade é vacinar os americanos”. O que parecia no início da pandemia um problema em escala mundial com uma série de reuniões e declarações diárias nas grandes mídias sobre a importância do isolamento social e a corrida no desenvolvimento de vacinas com apoio de outros países, virou apenas uma disputa para garantir os próprios interesses geopolíticos. O discurso de uma preocupação igualitária mostrou mais uma vez que o sistema econômico está acima das vidas que estão sendo perdidas pelo globo e que a imagem vendida pelos filmes de super-heróis norte-americanos que salvam a humanidade do grande vilão ficaram escondidas nas teias do capitalismo. Amanda Escobar Costa Graduanda em História (FFLCH-USP) e bolsista do Projeto CineGRI Ciclo 2020-2021. #vestibular #vacina #covid-19 #desigualdade #geopolítica #mundo #economia Referências bibliográficas: Mapa da vacinação no mundo: quantas pessoas já foram imunizadas contra covid-19?. Opera Mundi, 2021. Disponível em: CHARLEAUX, João Paulo. A desigualdade entre países ricos e pobres no acesso à vacina Nexo, 2021. Disponível em: . SCOTTIE, Andrew. Desigualdade: 3 a cada 4 vacinas contra Covid estão em apenas 10 países, diz ONU. Disponível em: Tudo que você precisa saber sobre 5 vacinas contra o coronavírus. Disponível em: SÁ, Nelson de. Vacina é para 'braços americanos', respondem EUA; China avança. Disponível em:

  • A produção da vacina e os resquícios do colonialismo

    “A China, lamentavelmente, já existe um descrédito muito grande por parte da população, até porque, como muitos dizem, esse vírus teria nascido por lá”. A frase proferida pelo presidente Jair Bolsonaro ao se referir à Coronavac, imunizante produzido pelo Instituto Butantã com insumos chineses, serve como um bom panorama para entender a narrativa de descrédito, baseada em ideais racistas e xenofóbicos, que vem se alastrando desde o início da pandemia de Covid-19. Nesta lógica, somente países desenvolvidos economicamente, que tradicionalmente se localizam no centro do sistema capitalista, seriam capazes de oferecer alternativas seguras para conter o vírus. Mas será que isso condiz com a realidade? Dados fornecidos pelo Centro de Estudos de Casos Globais de Covid-19, da Universidade Johns Hopkins, ajudam a evidenciar que essa narrativa não se sustenta. Países com altos índices de Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), como os Estados Unidos (0,915), Reino Unido (0,907) e Itália (0,873), registraram muito mais mortes pelo vírus em comparação com nações mais pobres, tais como: Libéria (0,430), Tanzânia (0,521) e Haiti (0,483). É claro que diversas variáveis como nível de testagem e acesso à informação devem ser consideradas, mas, ainda assim, esses números possuem seu valor de comparação. Para além do preconceito existente nos discursos adotados por certas lideranças, também podemos observar como a desigualdade opera no acesso aos insumos e produção das vacinas. Países ricos como o Canadá, por exemplo, adquiriram doses suficientes para vacinar seus cidadãos cinco vezes. Outras nações economicamente desenvolvidas como Estados Unidos e Reino Unido contaram com tecnologia e mão de obra suficientes para desenvolver seus próprios imunizantes, sem depender de insumos estrangeiros. Já nos países que se localizam na periferia do sistema capitalista, com menor capacidade de produção e aquisição de imunizantes, o cenário é absolutamente distinto. Dados da Oxford Martin School afirmam que as regiões Sul-Americana e Africana possuem média de somente 0,11 e 0,01 vacinados por grupo de cem pessoas, respectivamente. Enquanto isso, continentes mais ricos como América do Norte e Europa contam com níveis de 3,21 e 1,65, nessa ordem. #PraCegoVer [FOTOGRAFIA]: Dois personagens discutem em frente ao leito de um hospital. O da esquerda segura uma garrafa de água, já o da direita, segura um papel dobrado. Enquanto isso, o médico observa a conversa enquanto coloca sua mão direita sob o paciente deitado na cama e com a mão esquerda segura uma caixa branca, que aparenta ser um medicamento. Fonte: http://www.tropadercy.com.br/2017/09/o-jardineiro-fiel-recomendacao-de-filme.html O filme “O Jardineiro Fiel” (Fernando Meirelles, 2005) aborda as desigualdades socioeconômicas em nível global, em um roteiro de ficção que denuncia crimes cometidos pela indústria farmacêutica, em conjunto com o governo britânico, em solo queniano. Na trama, o diplomata Justin Quayle (Ralph Fiennes) investiga o assassinato de sua esposa Tessa (Rachel Weisz), ativista de direitos humanos morta em circunstâncias suspeitas e pouco esclarecidas. O roteiro levanta questões importantes como a corrupção, a assimilação cultural e as relações desiguais de poder, que permitem um verdadeiro genocídio sob solo estrangeiro, sem nenhuma punição ou investigação, evidenciando a manutenção de um contexto colonialista no continente africano. É inevitável traçar paralelos com nosso contexto atual, no qual direitos humanos fundamentais, como o acesso à saúde pública universal e gratuita de qualidade, ficam à mercê de interesses econômicos, capitaneados por nações ricas e grandes corporações. A pandemia de Covid-19 serviu para evidenciar que estamos longe de viver em mundo igualitário. A capacidade de resposta às catástrofes e desastres naturais estão diretamente ligadas à capacidade produtiva e riqueza econômica das nações. O investimento em ciência, tecnologia e educação são fundamentais para garantir que todos os países estejam preparados para responder à altura aos próximos desafios que o futuro nos reserva. Yan Carvalho Graduando em Ciências Sociais #coronavac #vacina #desigualdade #meirelles #geopolítica Referências bibliográficas: CHARLEAUX, João Paulo. A desigualdade entre países ricos e pobres no acesso à vacina Nexo, 2021. Disponível em: . Acesso em: 20 de fevereiro de 2021 Covid-19: África lança rede para estudar o novo coronavírus. DW, 2020. Disponível em: . Acesso em: 20 de fevereiro de 2021 Mapa da situação. Correio da Manhã, 2021. Disponível em: . Acesso em: 20 de fevereiro de 2021 Mapa da vacinação no mundo: quantas pessoas já foram imunizadas contra o Covid-19?. Opera Mundi, 2021. Disponível em: . Acesso em: 20 de fevereiro de 2021

  • Coringa e a negligência com as doenças mentais

    #PraCegoVer [FOTOGRAFIA] : Homem parado em frente a um espelho com o rosto pintado como um palhaço, com as cores branco, azul e vermelho, vestido com uma camisa verde, um colete amarelo e um paletó vermelho. No espelho está escrito em vermelho “Put on a happy face” (Coloque um sorriso no rosto, em tradução livre). Fonte: http://www.adorocinema.com/noticias/filmes/noticia-150859/ O filme Coringa (Todd Phillips, 2019) conta a origem desse vilão dos quadrinhos. Apesar de ser um filme de super-herói, levanta a importante pauta da saúde mental, tema que foi abordado na redação do ENEM deste ano. Quando o palhaço profissional Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) tem seu tratamento psiquiátrico interrompido devido aos cortes de gastos do governo e sem ter a possibilidade de arcar com os custos com remédios e terapia, vemos como a negligência do Estado e a exclusão promovida pela própria sociedade ao não saber lidar com os diferentes colabora para a piora de Arthur até se tornar o vilão Coringa. Nos Estados Unidos cerca de 37% dos detentos possuem histórico de doença mental [1]. A falta de políticas públicas e centros de tratamento especializados acabam sobrecarregando o sistema carcerário do país. Além de serem taxadas como violentas e perigosas, as pessoas com transtornos mentais que não possuem condições de pagar pelo tratamento adequado, muitas vezes são encaminhadas para o sistema prisional, tendo em vista que os hospitais estadunidenses podem se recusar a receber pacientes sem condições financeiras. #PraCegoVer [FOTOGRAFIA]: Imagem de uma mulher negra, com a boca entreaberta com a legenda “Esta é a última vez que nos encontramos.” Fonte: https://hqscomcafe.com.br/2019/10/08/5-grandes-momentos-que-transformara m-arthur-fleck-em-coringa/ Segundo o Ministério da Saúde, cerca de 3% da população geral brasileira sofre com transtornos mentais severos e persistentes [2] e graças ao Sistema Único de Saúde milhares de pessoas têm acesso ao tratamento gratuito e de qualidade, com profissionais especializados, como psiquiatras, psicólogos, terapeutas ocupacionais, enfermeiros e também acesso à medicação gratuita. Seja em uma das unidades do CRAS (Centro de Referência de Assistência Social), em AME’s (Ambulatórios Médicos Especializados) ou até mesmo no posto mais próximo da sua casa, é possível ter acompanhamento psicológico totalmente gratuito. Em 2001, a Luta Anti Manicomial conseguiu, com a Reforma Psiquiátrica, mudanças no modelo de tratamento das doenças mentais e ao invés de isolamento, foi aprovado que o convívio com a família e a comunidade seriam essenciais para a reabilitação e tratamento dos pacientes. É importante reforçar que Saúde Mental é uma questão de Saúde Pública, também sendo necessário que essas pessoas sejam incluídas e amparadas pela sociedade, a exclusão e o encarceramento dessa parcela vulnerável da população não são a saída. A defesa e proteção do SUS é papel de todos. Se o tratamento de Arthur não tivesse sido cortado, talvez o desfecho da história fosse completamente diferente. Gabriela Bucalo Bolsista CineGRI Ciclo 2020/2021 e Graduanda em Geografia (FFLCH-USP) #Coringa #SaúdeMental #SUS #SaúdePública Referências bibliográficas: [1] ORAZÉM, E. Saúde mental nos EUA: enquanto hospitais negam pacientes, cadeias nunca dizem não. Disponível em: . Acesso em: 10/02 [2] Saúde Mental. Disponível em: Acesso em: 30/01

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